segunda-feira, 3 de novembro de 2008

Mudança nos costumes alimentares levam muitos a hospitais

Karla Correia e Luciana Abade, Jornal do Brasil

BRASÍLIA - Aos 32 anos, Helena Leal Rodrigues já fez duas cirurgias cardíacas para trocar válvulas de seu coração. Sofre com o colesterol alto e hipertensão, controlada a base de medicamentos.

Não pode trabalhar nem realizar esforço físico por conta de uma cardiopatia – diagnosticada aos 15 anos, em um exame rotineiro para permitir a prática de educação física no colégio – agravada ao longo do tempo pela dieta pesada em gorduras e sal.

Até a sua segunda cirurgia, conta, ninguém a havia alertado sobre a necessidade de hábitos alimentares saudáveis. O que, em seu caso, significaria cortar sódio e gorduras, além de aumentar o consumo de verduras ricas em vitamina K.

– Com uma dieta mais adequada, talvez eu não tivesse tantos problemas quanto eu tenho hoje – diz Helena, casada, mãe de uma filha de nove anos.

Como ela não pode trabalhar, a família se sustenta com o salário de seu marido, Evangelista Rodrigues, garçom. Internada no Hospital Universitário de Brasília (HUB), ela espera o conserto de um aparelho no Instituto do Coração (Incor-DF) para realizar um cateterismo.

– Não posso fazer nada por causa da minha saúde. Há três anos que eu não trabalho. Eu era supervisora em um restaurante. Hoje, não tenho energia nem para subir uma escada, quanto mais para trabalhar.

Dois mundos
Helena é o retrato das mudanças de hábitos alimentares de uma fatia expressiva da sociedade brasileira que, com a elevação do seu poder aquisitivo, passou a ter acesso a alimentos industrializados, ricos em sódio e gorduras saturadas, mas continua sem alcançar um grau satisfatório de atenção na rede pública de saúde.

Só muito recentemente, conta, teve acesso a nutricionista e informações sobre cuidados necessários com sua alimentação.

– Ainda não vencemos a guerra contra doenças tropicais por conta da falta de saneamento, de acesso a esgoto, de investimento em campanhas duradouras de erradicação de mosquitos como o da dengue – observa o infectologista Ivo Castelo Branco.
– E, mesmo assim, temos de conviver com o crescimento do número de casos de hipertensão, obesidade e doenças cardíacas em geral. Que são fruto do acesso a alimentos industrializados, do sedentarismo – que vem da automatização do trabalho, da migração do meio rural para o urbano.

São reflexos simultâneos do desenvolvimento e do subdesenvolvimento na mesma população.

Campanhas tardias
Com a sobrecarga no sistema de saúde, surtos de doenças que já deveriam estar erradicadas no território nacional tornam-se comuns. Na década de 90, uma ameaça de epidemia de cólera pôs o Ministério da Saúde em estado de alerta. No ano passado, tivemos surtos de febre amarela e rubéola.

A campanha de vacinação deflagrada para combater a epidemia chegou atrasada para Rafael Parucker, 25 anos, bacharel em Direito. No segundo semestre de 2007, Rafael começou a sentir dores fortes na garganta, articulações, cabeça e olhos, febre e manchas por todo o corpo. De início, os médicos suspeitaram se tratar de dengue. Só o exame laboratorial deixou claro que era rubéola.

– Fiquei de cama durante uns cinco dias e ainda contaminei meu irmão e dois colegas de faculdade – lembra Rafael.

Altamente contagiosa, a doença chamou a atenção do Ministério da Saúde, que mobilizou uma campanha para a vacinação de 30 milhões de pessoas nos meses seguintes, o que daria o direito ao país de solicitar à Organização Mundial da Saúde (OMS) o certificado de erradicação desse mal, que ataca principalmente homens mas tem seus piores efeitos em bebês cujas mães contraíram a doença quando grávidas.

Novos riscos

O que mais preocupa os especialistas, no entanto, é a possibilidade do ressurgimento de doenças já controladas em versões mais resistentes aos medicamentos conhecidos. É o caso da tuberculose.

A doença, de tratamento prolongado e penoso para o paciente, desenvolve facilmente variedades resistentes a medicamentos, no caso de tratamento interrompido. Na opinião do professor da UnB, José Ricardo Marins, os gestores públicos não tratam a tuberculose com seriedade. É preciso treinar pessoas para acompanhar os pacientes, já que muitos desistem do tratamento por causa dos severos efeitos colaterais.

A mesma negligência, segundo o professor, ocorre com a hanseníase. Nesse caso, o problema é o diagnóstico tardio, motivo principal das deformações apresentadas por pacientes.

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